São Silvestre I

Sexta-feira, 31 de dezembro de 2010


Este Papa dos inícios da nossa Igreja era um homem piedoso e santo, mas de personalidade pouco marcada. São Silvestre I apagou-se ao lado de um Imperador culto e ousado como Constantino, o qual, mais que servi-lo se terá antes servido dele, da sua simplicidade e humanidade, agindo por vezes como verdadeiro Bispo da Igreja, sobretudo no Oriente, onde recebe o nome de Isapóstolo, isto é, igual aos apóstolos.

E na realidade, nos assuntos externos da Igreja, o Imperador considerava-se acima dos próprios Bispos, o Bispo dos Bispos, com inevitáveis intromissões nos próprios assuntos internos, uma vez que, com a sua mentalidade ainda pagã, não estava capacitado para entender e aceitar um poder espiritual diferente e acima do civil ou político.

E talvez São Silvestre, na sua simplicidade, tivesse sido o Papa ideal para a circunstância. Outro Papa mais exigente, mais cioso da sua autoridade, teria irritado a megalomania de Constantino, perdendo a sua proteção. Ainda estava muito viva a lembrança dos horrores por que passara a Igreja no reinado de Diocleciano, e São Silvestre, testemunha dessa perseguição que ameaçou subverter por completo a Igreja, terá preferido agradecer este dom inesperado da proteção imperial e agir com moderação e prudência.

Constantino terá certamente exorbitado. Mas isso ter-se-á devido ao desejo de manter a paz no Império, ameaçada por dissenções ideológicas da Igreja, como na questão do donatismo que, apesar de já condenado no pontificado anterior, se vê de novo discutido, em 316, por iniciativa sua.

Dois anos depois, gerou-se nova agitação doutrinária mais perigosa, com origem na pregação de Ario, sacerdote alexandrino que negava a divindade da segunda Pessoa e, consequentemente, o mistério da Santíssima Trindade. Constantino, inteirado da agitação doutrinária, manda mais uma vez convocar os Bispos do Império para dirimirem a questão. Sabemos pelo Liber Pontificalis, por Eusébio e Santo Atanásio, que o Papa dá o seu acordo, e envia, como representantes seus, Ósio, Bispo de Córdova, acompanhado por dois presbíteros.

Ele, como dignidade suprema, não se imiscuiria nas disputas, reservando-se a aprovação do veredito final. Além disso, não convinha parecer demasiado submisso ao Imperador.

Foi o primeiro Concílio Ecumênico (universal) que reuniu em Niceia, no ano 325, mais de 300 Bispos, com o próprio Imperador a presidir em lugar de honra. Os Padres conciliares não tiveram dificuldade em fazer prevalecer a doutrina recebida dos Apóstolos sobre a divindade de Cristo, proposta energicamente pelo Bispo de Alexandria, Santo Atanásio. A heresia de Ario foi condenada sem hesitação e a ortodoxia trinitária ficou exarada no chamado Símbolo Niceno ou Credo, ratificado por S. Silvestre.

Constantino, satisfeito com a união estabelecida, parte no ano seguinte para as margens do Bósforo onde, em 330, inaugura Constantinopla, a que seria a nova capital do Império, eixo nevrálgico entre o Oriente e o Ocidente, até à sua queda em poder dos turcos otomanos, em 1453.

Data dessa altura a chamada doação constantiniana, mediante a qual o Imperador entrega à Igreja, na pessoa de S. Silvestre, a Domus Faustae, Casa de Fausta, sua esposa, ou palácio imperial de Latrão (residência papal até Leão XI), junto ao qual se ergueria uma grandiosa basílica de cinco naves, dedicada a Cristo Salvador e mais tarde a S. João Batista e S. João Evangelista (futura e atual catedral episcopal de Roma, S. João de Latrão). Mais tarde, doaria igualmente a própria cidade.

Depois de um longo pontificado, cheio de acontecimentos e transformações profundas na vida da Igreja, morre S. Silvestre I no último dia do ano 335, dia em que a Igreja venera a sua memória. Sepultado no cemitério de Priscila, os seus restos mortais seriam transladados por Paulo I (757-767) para a igreja erguida em sua memória.

São Silvestre, rogai por nós!

[Canção Nova]

Hoje: Dia da Esperança e dia das Devoluções

Santos: Silvestre I (Papa), Barbaciano de Ravena (presbítero), Catarina Labouré (religiosa vicentina, propagou a devoção da “medalha milagrosa”), Columba de Sens (virgem, mártir), Donata, Paulina, Rústica, Nominanda, Serótina, Hilária e Companheiras (virgens, mártires de Roma, na Via Salária), Estêvão, Ponciano, Atalo, Fabiano, Cornélio, Sexto, Floro, Quintiano, Minervino e Simpliciano (mártires em Catânia), Hermes de Roma (mártir), Mário de Avenches (bispo), Ofa de Benevento (abadessa), Piniano e Melânia (casal de Roma), Sabiniano e Potenciano (bispos de Sens), Zótico de Constantinopla (presbítero), Pedro de Subiaco (monge, mártir, bem-aventurado), Walemberto de Cambrai (abade, bem-aventurado), Wisinto de Kremsmünster (abade, bem-aventurado).

Antífona: Um menino nasceu para nós; um filho nos foi dado! O poder repousa nos seus ombros. Ele será chamado “mensageiro do Conselho do Deus” (Is 9,6)

Oração: Deus eterno e todo-poderoso, que estabelecestes o princípio e a plenitude de toda a religião na encarnação do vosso Filho, concedei que sejamos contados entre os discípulos daquele que é toda a salvação da humanidade. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.


Leituras

Leitura: I Carta de São João (1Jo 2, 18-21)

Nenhuma mentira provém da verdade

Filhinhos, esta é a última hora. Ouvistes dizer que o anticristo virá. Com efeito, muitos anticristos já apareceram. Por isso, sabemos que chegou a última hora. Eles saíram do nosso meio, mas não eram dos nossos, pois se fossem realmente dos nossos, teriam permanecido conosco. Mas era necessário ficar claro que nem todos são dos nossos. Vós já recebestes a unção do santo, e todos tendes conhecimento. Se eu vos escrevi, não é porque ignorais a verdade, mas porque a conheceis, e porque nenhuma mentira provém da verdade.

Palavra do Senhor!

Comentário da I Leitura

Vós já recebestes a unção do santo

O apóstolo adverte os discípulos contra os falsos doutores, por ele comparados aos 'anticristos". Jesus admoestara a que fugíssemos dos "falsos profetas" (Mt 24,23-24), opostos à mensagem de Cristo, que a Igreja encontraria através dos séculos. O aspecto mais doloroso é que muitos de tais adversários saem das fileiras dos crentes (versículo 19); algum era talvez sacerdote, religioso, teólogo, e tornou-se estranho ou abertamente inimigo. A pertença à Igreja é um mistério que nenhum laço externo pode garantir, mas só a fidelidade a Deus na humildade e constante procura da verdade. Quem recusa a Igreja, recusa a Cristo, vive nas trevas e na mentira. O cristão, consagrado pela unção recebida do Santo" (versículo 20) no batismo e na crisma, deixa-se, porém, guiar suavemente pelo "Espírito de verdade", que vive e age nele por meio de Jesus Cristo. [MISSAL COTIDIANO, Paulus, 1997]


Salmo: 95(96), 1-2.11-12.13 (R/.11a)

O céu se rejubile e exulte a terra!

Cantai ao Senhor Deus um canto novo, cantai ao Senhor Deus, ó terra inteira! Cantai e bendizei seu santo nome! Dia após dia anunciai sua salvação.

O céu se rejubile e exulte a terra, aplauda o mar com o que vive em suas águas; 12os campos com seus frutos rejubilem e exultem as florestas e as matas.

Na presença do Senhor, pois ele vem, porque vem para julgar a terra inteira. Governará o mundo todo com justiça, e os povos julgará com lealdade.


Evangelho: João (Jo 1, 1-18)

E a palavra se fez carne e habitou entre nós

No princípio era a palavra, e a palavra estava com Deus; e a palavra era Deus. No principio estava ela com Deus.

Tudo foi feito por ela e sem ela nada se fez de tudo que foi feito. Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram dominá-la. Surgiu um homem enviado por Deus; seu nome era João. Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à fé por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz: daquele que era a luz de verdade, que, vindo ao mundo, ilumina todo ser humano.

A palavra estava no mundo - e o mundo foi feito por meio dela - mas o mundo não quis conhecê-la. Veio para o que era seu, e os seus não a acolheram. Mas, a todos que a receberam, deu-lhes capacidade de se tornarem filhos de Deus, isto é, aos que acreditam em seu nome, pois estes não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do varão, mas de Deus mesmo.

E a palavra se fez carne e habitou entre nós. E nós contemplamos a sua glória, glória que recebe do Pai como Filho unigênito, cheio de graça e de verdade. Dele, João dá testemunho, clamando: "Este é aquele de quem eu disse: 'O que vem depois de mim passou à minha frente, porque ele existia antes de mim"' De sua plenitude todos nós recebemos graça por graça. Pois por meio de Moisés foi dada a lei, mas a graça e a verdade nos chegaram através de Jesus Cristo. A Deus, ninguém jamais viu. Mas o unigênito de Deus, que está na intimidade do Pai, ele no-lo deu conhecer.

Palavra da Salvação!

Comentário o evangelho

Nós vimos a sua glória

Pouco a pouco, a comunidade cristã foi compreendendo a verdadeira identidade de Jesus. Até então, na história da salvação, ninguém havia se apresentado como Messias Filho de Deus. Na verdade, os reis de Israel eram considerados filhos de Deus. Entretanto, jamais alguém havia manifestado tal proximidade com Deus, no falar e no agir, como acontecia com Jesus. Ninguém havia chamado Deus de Pai, servindo-se de um termo familiar, Abba, usado pelas crianças para se referirem a seus genitores. Ninguém se apresentara com o poder de perdoar pecados, restituir a vida aos mortos e enfermos, libertar as pessoas da opressão do demônio. Ninguém, como Jesus, mostrava-se livre diante da Lei e das tradições religiosas.

Na raiz da ação de Jesus, estava sua condição divina. Esta conferia-lhe a liberdade para não se submeter ao legalismo religioso da época, muitas vezes incapaz de levar as pessoas a uma real experiência de Deus; levava-o a desbaratar as forças do anti-Reino, por cuja ação os indivíduos se tornavam cativos do mal e do pecado; dava-lhe um coração misericordioso, como o de Deus, para amar os pecadores e abrir-lhes os caminhos da salvação; tornava-o sensível e solícito aos sofrimentos da humanidade. Nestas ações humanas de Jesus, resplandecia sua glória de Filho de Deus.
[O EVANGELHO NOSSO DE CADA DIA, Ano A, ©Paulinas, 1997]