A Igreja Católica e os conflitos entre agricultores e indígenas

Pela enésima vez, o território da Diocese de Dourados se tornou palco de enfrentamentos entre indígenas e agricultores, revelando o descaso e a desumanidade do Poder Executivo e Judiciário ante uma situação de injustiça que a todos preocupa e prejudica.

Nesses 15 anos desde que assumi o serviço pastoral na Diocese de Dourados, habitada por uma população de 35.000 índios confinados em aldeias incapazes de os sustentar, e por igual ou superior número de agricultores que adquiriram legalmente suas propriedades e delas precisam para viver, foram inúmeras as vezes em que os Bispos do Mato Grosso do Sul unimos nossas vozes aos que apresentam como solução viável e aceita por ambas as partes, a compra de terras pelo Governo Federal, para oferecê-las aos indígenas para que delas tirem o seu sustento.

Infelizmente, ao longo destes anos, as promessas feitas pelo Governo Central para encontrar uma saída para a “questão indígena”, não saíram do papel. Os grupos de trabalho organizados para ajudar na solução, não funcionaram. E as tímidas tentativas feitas para indenizar os proprietários de boa fé que adquiriram suas terras, foram abortadas pela Justiça local. Numa palavra, o Estado parece não ter a menor intenção de agir.

De nossa parte, os Bispos do Mato Grosso do Sul, se jamais nos posicionamos a favor das “retomadas” de propriedades privadas (que para a lei e os agricultores são “invasões”), da mesma forma sempre nos posicionamos contra o uso da força e da violência perpetrada pelos mais fortes contra os mais fracos. Pedimos aos agricultores e indígenas cristãos que, sustentados e irmanados pela solidariedade, unam suas forças para pressionar as autoridades civis e judiciárias, no intuito de obter a tão almejada paz para todos, alicerçada na justiça. Pensamos que, nessa tarefa, lhes é de grande ajuda a exortação do Papa Francisco, contida em sua Encíclica: “A Alegria do Evangelho”, de 24 de novembro de 2013: «Ninguém nos pode exigir que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocupar com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciar sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos. Uma fé autêntica – que nunca é cômoda nem individualista – comporta sempre um profundo desejo de mudar o mundo, transmitir valores, deixar a terra um pouco melhor depois da nossa passagem por ela. Amamos este magnífico planeta, onde Deus nos colocou, e amamos a humanidade que o habita, com todos os seus dramas e cansaços, com os seus anseios e esperanças, com os seus valores e fragilidades. A terra é a nossa casa comum, e todos somos irmãos».

Dourados, 27 de junho de 2015

Dom Redovino Rizzardo, cs

Bispo diocesano de Dourados


(4) Comentários

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Prezado Maurício, muito obrigado pelo seu comentário. Na "Nota" que eu publiquei, eu me referi aos pequenos e médios agricultores de nossa Diocese. Muitos deles são católicos. Ao longo destes anos aprendi a ouvir e a dialogar com eles e com os irmãos indígenas. Percebi que todos querem a paz na justiça. Quanto aos dados do CIMI, eu já me posicionei (e questionei) a respeito em outras ocasiões.

 
Dom Redovino Rizzardo, cs em 29 de junho de 2015 às 15:31

Fico muito agradecido pelo comentário da Francinete. Crescemos muito mais pelas críticas do que pelos elogios! Para ela, eu queria responder que me dirijo aos agricultores cristãos, que encontro em minhas visitas pastorais. Não falo dos grandes fazendeiros, pois, para muitos deles, a Igreja e o Evangelho nada significam. Que Deus a abençoe! Dom Redovino

 
Dom Redovino Rizzardo em 29 de junho de 2015 às 15:21

Querido D. Redovino!

Agricultores ou Fazendeiros???? Para mim não são agricultores e sim grande fazendeiros de agronegócio.

 
Francinete em 28 de junho de 2015 às 15:08

Querido Dom Redovino!
confesso que não esperava um posicionamento tão neutro do representante da igreja católica na região onde pessoas são agredidas, assassinadas e discriminadas cotidianamente, conforme relatorios anuais do CIMI. A neutralidade significa permitir que isso continue ocorrendo!!! O Papa em sua mais recente enciclica se posiciona em defesa dos indígenas, o Sr. não deveria segui-lo?

 
Mauricio em 27 de junho de 2015 às 16:55